Ainda era noite e eu já ouvia a poesia do Guto Rodrigues gritar nas praças em forma de música.
Sua voz ecoava mais como protesto, em discursos contundentes contra a ditadura, e do seu violão saiam canções que açambarcavam espíritos e corações
Cresci aprendendo com o Guto que o sonho era possível. Assim me fiz gente .
Nos conhecemos no início dos anos 80, em plena campanha pela meia-passagem estudantil. Ali iniciava uma história de vida de muita gente. Guto manteve o discurso, a coerência e a canção.
Fazia teatro, política e poesia. Sua formação intelectual foi arraigada no marxismo e na literatura humanista. Adorava compartilhar conhecimento com a juventude.
O tempo passou. Derrotamos a ditadura e no ano passado mandamos o fascismo pastar na papuda. Guto continua firme na luta.
Em 2020, ele lançou o álbum Além da Aldeia, uma reunião de boas músicas, letras cantadas por sua companheira Enne e sua filha Lucy. Não tardou para ter reconhecimento além da aldeia.
Recentemente, o blog do Gilvan Melo, um espaço visibilizado pelo mundo político e artístico do Rio de Janeiro, deu destaque a uma das suas músicas: canções pros amigos, uma ode ao amor e aos seus queridos de vida.
Além da Aldeia é um presente para quem gosta do lirismo poético de um artista crítico, terno e utópico. Aquela utopia que ainda rega a primavera.
Guto vive. Vive como homem da resistência e da paixão. Herdou o popular do seu pai Carapanã, um artista do povo. Sua arte se construiu na luta, no sentimento de justiça e de solidariedade.
Guto já passou dos 70 e ainda respira o ar que oxigena a esperança de um mundo melhor.
Como dizia Nestor Nascimento, Guto é nosso camarada.
Lúcio Carril
Sociólogo
Imagem: Amazonas Atual