Minha querida Manaus,
Um novo ano se aproxima. Te escrevo para dizer que dias melhores virão.
Conheço teu povo, sua história, seu jeito de ser.
Sei que há um desejo alvissareiro de ter uma cidade mais humanizada, bem cuidada, sem a ferida profunda da corrupção.
Têm momentos difíceis, eu sei. Já pensaste em me esquecer, que não sou capaz de me tornar realidade. Entendo teu sofrimento, tua agonia.
Sei o quanto é difícil pensar em mim, se em meu nome já te abandonaram, te enganaram, dilapidaram teu patrimônio, roubaram o dinheiro do teu povo.
Passa governo, volta governo e a conversa é a mesma: tudo vai melhorar; a saúde e a educação terão plenitude de atendimento; o transporte será para um coletivo de gente e não para uma sofrida manada; o recurso público terá destino correto e honesto…
E por aí governantes vão solapando teu desejo, até chegar às profundezas do desespero.
Não é de hoje que te maltratam, Manaus.
Quando colonizadores famintos de riqueza aqui adentraram, ouvi gritos e vi lágrimas dos povos nativos. Eles sequer me conheciam, pois viviam do jeito que escolheram e de acordo com suas vontades.
Ouvi e vi o sofrimento de morte e escravidão desses povos. Nada pude fazer, pois me tornei irreal para quem deixou de existir.
Vi e ouvi também o clamor dos seringueiros e dos negros. Lá estive junto ao seu padecimento. Me fiz parte da sua resistência.
O tempo foi passando e fui acompanhando teu crescimento. Ao teu lado tenho visto falso pastores e profetas, políticos continuarem te enganando, o suor da tua gente sendo tirado por reles salários, tua vida sendo jogada fora pela violência e pelo abandono.
Como me dói tudo isso, Manaus. Como eu gostaria de ser uma outra realidade, sonhada e pedida nas tuas preces.
Mas não desista. Faça dos teus sonhos um motivo de luta e de fuga dos teus algozes.
Pense que teu povo pode afugentar os políticos bandidos, os empresários exploradores, os cidadãos e cidadãs ruins, maledicentes.
Fortalece teu sentimento de mudança e dele surgirão dias melhores, com meu cheiro e com os sonhos que me aquecem.
Lúcio Carril
Sociólogo