Sou um sociólogo que continua morando em bairro pobre de Manaus. Aqui está minha gente. Entendo quem mora em condomínio fechado, buscando segurança e proteção. Mas para um sociólogo, a vida nesse panóptico é alienante. A sociologia não deve ser de cima pra baixo ou metida em tecidos sociais da classe média.
Ela tem que sujar o pé de lama e respirar o ar dos morros e favelas. A sociologia está na periferia e não nas células criadas pela exclusão social.
Conheço muita gente que pensa que defende um mundo melhor tomando cerveja na varanda do seu apartamento. Até acho que há boa intenção, mas é cômodo olhar a realidade que passa a cem metros de distância. Lá em baixo a vida é dura.
O mundo está repleto de sociólogo da contemplação, querendo falar da realidade como se ela fosse objeto de laboratório. Não sabe esse incauto que a sociologia tem suor, carne,osso, grito, choro, amor, indignação. Ela tem mais alma do que a vaidade dele.
Já não me convence mais o protesto sem prática, a voz que falha com medo, o mimimi da falta de leitura, a fofoca que substitui a reflexão. É preciso fazer o combate, mostrar a indignação, enfrentar os poderosos, escolher o alvo certo.
Defenestrar os nossos é fácil. Quero ver partir pra cima de quem está no poder.
Faço esse desabafo como sociólogo da resistência e da reflexão crítica, que lamenta a omissão e a covardia de tanta gente que deveria fazer o enfrentamento, mas resolveu mergulhar na dissimulação, como se fosse possível enganar a si mesmo.
A sociologia não é somente um conhecimento da realidade. Ela nos exige compreender e lutar para transformar o mundo. O sociólogo tem que ser um militante.
Não podemos desconsiderar as escolhas pela produção do conhecimento, mas temos que ter em vista a instrumentalização desse conhecimento para construir a justiça social e a liberdade.
E como fica nossa posição na Amazônia?
Somos sociólogos da Amazônia e não devemos entrar na onda do capital, como pautar uma tal de “economia verde”. Não é essa abordagem que queremos. A Amazônia é nosso lar, nossa cultura, nosso espaço de vida, onde nossos pais, avós, bisavós viveram e ainda vivem.
A noção de economia não nos contempla. Somos gente. Nossa sociologia é de gente e não da economia.
Nossos povos não são objetos. Nosso potencial natural não é um vale do sicilício. Queremos viver bem, mas preservando nossa forma de vida.
É bom que se diga: o capitalismo é destruidor. Se entrar na Amazônia da forma que o sistema quer, já era
Lúcio Carril
Sociólogo